A maternidade ainda é medida por uma régua injusta, cheia de olhos atentos prontos para julgar cada o, dentro e fora de casa. A mulher, muitas vezes, carrega não só o peso da criação dos filhos, mas também a cobrança silenciosa e constante da sociedade, que dita o que é ser uma “boa mãe”, como se houvesse um único caminho possível.
Essa pressão, ora escancarada, ora sutil ou inconsciente, respinga na paternidade. Quando a mulher é levada a acreditar que precisa dar conta de tudo, que precisa controlar e conduzir cada detalhe, ela não o faz por escolha, mas por sobrevivência. Por medo de ser julgada se não fizer, e infelizmente, sabendo que, será julgada mesmo fazendo.
Lembro do começo da nossa jornada nesse mundo mágico que é ter um filho. Cada vez que eu pegava meu bebê nos braços, especialmente se começava a chorar, vinha aquele impulso automático da mãe de tomar a frente. Era instintivo, mas também aprendido. Aos poucos, com muito diálogo, ela percebeu que não precisava carregar tudo sozinha. E eu precisava, e queria, viver aquele momento com nosso filho. Foi importante, até porque, diferente da maioria dos lares, fui eu quem ficou com ele após o fim da licença-maternidade. Ela voltou ao trabalho e eu, trabalhando de home office, pude estar ali. Um privilégio, sim. Mas também uma escolha.
A licença-paternidade, que ainda é curta demais, não permitiria nem começar essa construção. Mas isso fica para outra conversa.
O que eu vivi foi transformador. Estive com meu filho em tempo integral por mais de um ano. E mesmo quando ele começou na escola meio turno, segui mais presente até os seus dois anos e meio até retornar ao trabalho presencial. eava com ele todos os dias, empurrando o carrinho pelas ruas, entre olhares de espanto e desconfiança. Foi ali que entendi: o mundo não sabe lidar bem com a paternidade ativa.
Fui encaixado em três caixinhas: a do super-pai (como se o mínimo fosse o máximo), a do pai gay (“cadê a mãe dessa criança?”), e a do pai vagabundo (“mas você não trabalha?”). Tudo porque estive presente. Porque cuidei. Como se o cuidado fosse território exclusivo das mães.
Ainda estamos engessados por estereótipos ultraados. Cuidar, amar e estar presente não tem gênero. A verdade é que romantizamos e demonizamos demais tanto a maternidade quanto a paternidade. Quando idealizamos ao ponto de apagar o cansaço, deslegitimamos a dor. Quando só falamos das dificuldades, esquecemos da beleza que é acompanhar de perto o desenvolvimento de um filho. E isso nos rouba o que há de mais valioso: a experiência real, com todas as suas nuances.
A realidade? Não sou super-herói. Mas me emociono quando meu filho me olha como se eu fosse. Não sou gay, mas que diferença faria? Amor é amor e isso não me faria menos pai. Também não sou vagabundo, mas organizo minha rotina para estar presente, levar na escola, brincar, conversar, impor limites e, principalmente, ouvir. Não sou desocupado, apenas fiz questão de ocupar um espaço que sempre me disseram que não era meu.
Sou um pai em construção. Um pai que tenta desconstruir velhas ideias, romper com padrões que disseram que "isso não é coisa de homem". E para isso, tenho ao meu lado os melhores professores: meus filhos e a mãe deles.
Sim, a sociedade julga muito mais as mães. Disso não há dúvida. Mas também julga os pais quando eles decidem realmente estar ali. E isso precisa mudar. Quando virem um pai participando, não aplaudam como se fosse algo extraordinário, nem coloquem em caixinhas. Deixe esse pai paternar em paz. Quem sabe assim, teremos cada vez menos abandonos e menos sobrecarga materna.