Na última vez que estive com minha mãe em Porto Alegre, trouxe de lá alguns livros. Na bagagem vieram três jóias. As biografias de Michele Obama e Lázaro Ramos e um outro livro, “O avesso da pele”, de Jeferson Tenório. Sem dúvida, o melhor dos três negros autores, ou seriam autores negros?
Sofrer Racismo
O tema do racismo é recorrente nos dias atuais. Até que enfim! Minha mãe, descendente de alemães, nasceu numa localidade chamada Linha Santa Catarina (onde hoje é Cruzaltense) no dia em que a segunda guerra acabou: 09 de abril de 1945. Por óbvio, carregou em sua educação, um pouco do anti-semitismo da época e também o racismo imperial. Nada virtuoso, mas era a realidade daqueles tempos. Mas não por isso deixou de questionar e, agora, aos 76 anos, continua me ensinando, revendo conceitos. Confesso que depois de ler os dois brasileiros, pude entender melhor o que é “sofrer racismo”. Nós, brancos, sabemos o conceito, mas não sabemos o que é sofrer. A diferença é abissal. Mas não vou falar de racismo, quero falar de amor, de sentimento.
Cadê o amor?
O mundo moderno é muito dual. A meu ver, nunca foi tão fácil falar de luz e sombra, de branco e preto. Por exemplo: o marketing enaltece a euforia, mas ignora a depressão. Para todo o lado que olhamos é possível identificar a polaridade das coisas. Mas há algo que ainda não conseguimos ver com clareza: o amor, tão bem cantado pela Rita Lee, em contraponto à nossa energia mais primitiva: a sexual. E nesse jeito moderninho de se viver, certos pilares de nossa vida vão se confundindo. Ruindo não seria um mau adjetivo.
Mais Alma, menos Ego
Hoje estamos vivenciando o auge do ego. Um tempo em que a vaidade funciona como central de controle. Muito do que se faz é baseado neste sentimento. Enquanto digito este texto, olho para meus dedos e não consigo deixar de reparar em minhas cutículas. Elas são uma espécie de rodapé de minhas unhas. Olha a vaidade aí. Mas a mulher que se apresenta sem unhas pintadas e com cutículas, está fora do circuito. Barbearias, academias, estéticas, redes sociais. Quanto tempo o brasileiro investe nesses ambientes. Alegam ser questão de saúde. Esquecem de que o dia só tem 24 horas. Sobra pouco tempo dedicam para a alma, como na obra de Lou Marinoff: Mais Platão, Menos Prozac, que ainda não li. Que tal mais alma e menos ego?
Vergonha
Ao tentar entender o que se a, sinto que as pessoas parecem ter perdido alguns critérios, presentes nas gerações adas. Um deles é a vergonha. Daria pra se dizer que a vergonha é uma espécie de medo, assim como se pode dizer que o medo é a ausência de amor. Mas o fato é que registrar a intimidade, exacerbar o culto ao corpo entre outras práticas, deixou de ser motivo de vergonha. Tem redes sociais específicas para isso e as cirurgias plásticas estão aí, para corrigir contornos indesejados. Tudo para que você viva sem vergonha e na moda, o valor de maior constância. E o resultado dessa química toda é um culto ao ego. E nesse dualismo, quem sofre é a alma, o avesso do ego. Vou ter de ler Sartre para entender melhor. Mas e o amor?
O Amor é o avesso da Vergonha
O amor é o nosso sentimento mais puro. De todos os sentimentos que temos, é o mais genuíno, ele é divino. O problema é que vivemos ao contrário. Em vez de tê-lo como ponto de partida, o temos como fim e o confundimos com felicidade. Se o amor é fim, não é um meio. Por isso, as relações ficam todas dependentes de sentimentos inferiores ao amor. Vaidade, prazer, domínio. Tudo é medo e tudo é ameaça quando o amor não é praticado, é só desejado. Prova disso é que ninguém fala de amor. As pessoas têm vergonha de falar de amor. O amor é o avesso da vergonha.